Por Leticia Ribeiro e Carlos Eduardo Morais

A outorga de ações a empregados, administradores ou prestadores de serviços de determinada empresa por meio de diferentes planos, como Stock Options, ou Restricted Stock Units (RSUs), tornou-se tema controverso nos tribunais brasileiros com decisões conflitantes nas esferas trabalhista e fiscal sobre a natureza desses valores.

Apesar da prática de concessão de ações ter se iniciado na década de 1950 nos Estados Unidos e na década de 1970 na Europa, sua utilização por grandes corporações foi sentida somente na década de 1990, representando um alinhamento de interesses entre executivos e acionistas na valorização da empresa, como forma, inclusive, de captação e retenção de talentos.

O seu efeito na economia e nas relações trabalhistas foi tão acentuado que em estudo feito nos anos 2000 pelo National Center for Employee Ownership (NCEO), dos Estados Unidos, já se afirmava que 62 a cada 100 empresas americanas tinham aprovado planos de Stock Options, beneficiando mais de 11 milhões de trabalhadores.

A ausência de regulamentação sobre o tema no Brasil gerou terreno fértil para as mais diversas discussões contábeis, fiscais e trabalhistas. A Lei das Sociedades por Ações é a única que traz um artigo que tangencia o assunto. Nele, há exigência de previsão estatutária autorizando a outorga de opção de compra de ações para administradores, empregados ou pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou às suas controladas, desde que haja aprovação do plano de opção de compra ou subscrição pela assembleia geral.

Somadas aos requisitos legais mencionados acima, há as exigências da Comissão de Valores Mobiliários por meio da deliberação nº 695/2012 e do pronunciamento técnico Código de Processo Civil (CPC) nº 10, impondo a divulgação da natureza e condições dos planos de remuneração em ações, da política contábil adotada, da quantidade e do valor pelos quais as ações foram emitidas.

Em todas as normas existentes no ordenamento jurídico atual foram desconsideradas as repercussões tributárias, previdenciárias e trabalhistas inerentes à concessão de ações. É justamente neste cenário de lacuna normativa que se constroem as mais discrepantes interpretações doutrinárias e jurisprudenciais a respeito dos planos de ações, bem como de seus impactos para os empregados.

A insegurança jurídica sobre os planos de remuneração em ações estimula a imprevisibilidade dos efeitos de sua concessão, dificultando a utilização desse sistema tão efetivo e utilizado em outros países.

Embora a atividade empresarial tenha como premissa indissociável a assunção de risco, a falta de regulamentação do tema acaba por reduzir a viabilidade e utilização de planos como os de stock options que poderiam ser ferramentas eficientes de estímulo ao trabalho e à economia, especialmente no atual mundo globalizado.

A tentativa de regulamentação levada a efeito pelo Projeto de Lei Complementar (PLP) 146/2019, que institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, também não foi adiante. Embora a boa intenção de finalmente tratar do tema, a inclusão de temática estranha ao objeto principal e originário da norma tornaria questionável sua aplicação indistinta a toda e qualquer relação jurídica, bem como a toda e qualquer sociedade empresária brasileira. O tratamento legal conferido ao tema pelo PLP pecava pela carência de elementos aptos que permitissem definir e compreender de forma clara e segura o sistema de remuneração por ações, seus impactos e repercussões.

Não há dúvida de que estamos atravessando um marco importantíssimo no cenário global e que será preciso buscar formas alternativas para fomentar a economia, impactada pela pandemia do último ano. Com isso, a regulamentação de planos para a concessão de ações para empregados torna-se cada vez mais urgente e necessária, inclusive para viabilizar meios mais modernos de reconhecimento e contraprestação.