Apesar de não distribuírem lucros, as fundações e associações são instituições de “vultosa criação e circulação de riquezas” e devem ser incluídas no direito à recuperação judicial ou extrajudicial e à falência.
Com esse entendimento, a 2ª Vara Cível da Comarca de Três Corações (MG), em liminar, antecipou os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial da Fundação Comunitária Tricordiana de Educação (FCTE), que mantém a Universidade Vale do Rio Verde (UninCor) e seu colégio de aplicação.
A decisão ainda suspende todas as ações e execuções contra a fundação por 180 dias, suspende todos os atos de constrição e expropriação e proíbe as instituições financeiras de promover novas retenções de recursos.
A juíza Fernanda Machado de Moura Leite já nomeou um escritório especializado para atuar como administrador judicial do caso e promover perícia prévia sobre as atuais condições de funcionamento da fundação e a regularidade da documentação. Com ou sem a conclusão da perícia, a devedora deverá interpor pedido de recuperação judicial em até 30 dias.
Culpa da crise
A instituição apontou a crise da Covid-19 e sua má gestão durante anos como razões para o acúmulo de dívidas fiscais e trabalhistas, entre outras. Além disso, indicou descumprimento de acordos, desvios de valores, apropriação de recursos, falta de transparência e contratações abusivas com desvio de finalidade.
No último mês de maio, foi determinada a prisão de um ex-presidente da fundação. Três membros da diretoria também foram indiciados por lavagem de dinheiro, apropriação indébita e organização criminosa, por um suposto desvio superior a R$ 50 milhões.
Atualmente, a autora vem sofrendo bloqueios judiciais diários, em quase mil processos cíveis e 650 trabalhistas, a grande maioria em fase de execução. Segundo a fundação, a situação torna inviável sua administração financeira e traz prejuízos ao pagamento dos salários de seus 465 funcionários, o que também afeta os mais de três mil alunos.
Fundamentação
Para Fernanda, “não é difícil constatar a grave situação financeira” da autora. O passivo elevado é de conhecimento público e notório, até mesmo porque outros procedimentos tramitam na mesma comarca e no mesmo juízo.
Apesar da falta de detalhes, a juíza considerou “plausível a existência de bloqueios de vultosas quantias em dinheiro”. Segundo ela, as constrições, caso mantidas, causarão risco para o resultado útil e para o próprio direito de ajuizamento da recuperação judicial.
Além disso, as quantias poderiam beneficiar apenas um pequeno grupo de credores, em prejuízo de outros que eventualmente não tenham acionado a Justiça.
A magistrada lembrou que o Judiciário tem autorizado a recuperação judicial de fundações com e sem fins lucrativos para garantir “a manutenção da fonte produtiva, dos empregos, da renda, o pagamento de tributos e todos os benefícios sociais e econômicos decorrentes de sua exploração”.
A magistrada ressaltou que, mesmo sem fins lucrativos, as fundações desempenham o papel de empresárias. Isso porque, apesar de não repartirem lucros entre sócios, exercem a “atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”, conforme o artigo 966 do Código Civil.
A ação foi patrocinada pelo escritório Marcello Macêdo Advogados. Segundo o advogado Uri Wainberg, a decisão reconhece a legitimidade de fundação privada para requerer recuperação judicial. Assim, a autora poderá pagar os credores por meio de um plano de recuperação.