Por Victor Senteio

A apropriação e a utilização de crédito acumulado do ICMS são regidas pela Portaria CAT 26/2010 [1], instrumento utilizado por contribuintes que naturalmente acumulam créditos de ICMS de acordo com a característica da sua atividade tal como a aplicação de alíquotas diferenciadas em operações de entrada e saída, redução de base de cálculo do imposto com manutenção do crédito, isenção não incidência e diferimento.

Diferentemente do que se imagina, o acúmulo de saldo credor de ICMS representa um negativo ingresso de ativo no balanço de uma empresa, afetando negativamente sua saúde financeira, se não aproveitado, uma vez que se traduz em saída de capital que não retorna com a mesma liquidez, ficando o numerário estocado na contabilidade, até que seja autorizada a sua apropriação e transferência pela autoridade administrativa.

Não somente, esses créditos acumulados não são aceitos pela Receita Federal para fins de apuração do Lucro Real e da Base de Cálculo da CSLL, sendo, portanto, prejudicial a sua manutenção no ambiente de saldo credor da Secretaria da Fazenda Estadual, razão pela qual deve-se buscar a sua utilização o quanto antes.

Para ajustar esse cenário criado pela não-cumulatividade do ICMS, a legislação paulista acertadamente prevê a utilização do crédito acumulado como moeda de troca, podendo ser transferido 1) a outros estabelecimentos da empresa; 2) ao estabelecimento da empresa interdependente; e, 3) para estabelecimento fornecedor a título de pagamento das aquisições, sendo esse último, o mais utilizado.

Quer dizer, a legislação estadual confere ao contribuinte que suporta a oneração temporária do crédito acumulado de ICMS, o direito de empregá-lo como moeda corrente, finalmente operando de maneira igualitária para com relação aos setores que não suportam o reflexo da não-cumulatividade.

Ocorre que, por depender de procedimento administrativo que reconheça o direito de apropriação dos créditos e posteriormente os deposite em saldo de créditos, e ainda, autorize sua transferência, fica o contribuinte acumulador dependente de análises e deferimentos por parte da Secretaria da Fazenda Estadual, que sob a égide da legislação genérica, tem o prazo de até 120 dias para processar, analisar, deferir e cotejar (depositar os créditos na conta de ICMS do contribuinte).

Muito embora o prazo genérico, esses pedidos costumavam ser atendidos dentro do mesmo mês do pedido de transferência, de forma que os créditos acumulados atingiam seu real e único objetivo, o de ser utilizado como moeda corrente e instrumento de negociação, sendo imperiosa lembrança de que uma correspondência monetária não deve aguardar 120 dias para ser utilizada, ao passo que fornecedor nenhum aguarda tal prazo para receber pelo seu produto ou serviço.

Hodiernamente essa situação está afetada, diante de um cenário de greve de fiscais da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo[2], que em operação padrão, têm suprimido os pedidos de apropriação e transferência de créditos acumulados, que não são deferidos no prazo adequado à sua real finalidade.

Esse instrumento que confere ao crédito acumulado um caráter de moeda corrente é conferido pelo Estado com uma única intenção: Representar uma equivalência monetária e liquidez para que o contribuinte a utilize na sua atividade empresarial. No entanto, sua apreciação e deferimento tornou-se tão morosa que retirou do contribuinte o direito de utilizá-lo como capital, já que a transferência, que costumava ocorrer no mesmo mês, passou a levar até quatro meses, influenciando diretamente no poder de compra (morosidade na efetivação do pagamento) e, por conseguinte, na competitividade para com os demais setores que desejam adquirir a mesma mercadoria.

A afetação da bem-feita política econômica materializada na Portaria CAT 26/2010, não fere somente a empresa e o consumidor final (que é onerado pelo efeito cascata que a falta de liquidez causa), mas também o Direito como um todo, que desde sua estrutura básica cobra o célere comportamento do fisco e a efetividade da máquina pública.

Por se tratar de medida de urgência, principalmente para a indústria de alimentos, contribuintes têm ingressado no Judiciário objetivando o cumprimento do prazo estipulado pela legislação, para a efetivação da análise, transferência e cotejo dos créditos acumulados com a maior brevidade possível, a fim de permitir o Direito Constitucionalmente adquirido de concorrência e de liberdade econômica das empresas que são naturalmente afetadas pela correspondência da sua atividade.

[1] https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/pcat1182010.aspx

[2] https://www.sindaspcg.org.br/index.php/2021/09/03/cad-no-682-2