Por Ricardo Calcini e Leandro Bocchi de Moraes

De acordo com a nova classificação da Organização Mundial da Saúde, a Síndrome de Burnout, também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, será considerada uma doença ocupacional [1].

Esta nova classificação foi aprovada durante a 72ª Assembleia Mundial da Organização Mundial da Sáude — OMS, e passará a valer a partir do dia 1º de janeiro de 2022 [2].

A Síndrome de Burnout é um transtorno psíquico originado pelo cansaço extremo, e que possui relação com o trabalho afetando a pessoa em diversos setores da sua vida [3].

Indubitavelmente, após o surgimento e durante a pandemia, houve um agravamento da doença e o aumento exponencial do número de casos.

Uma pesquisa realizada pela Pebmed [4], publicada em novembro de 2020, apontou que 78% dos profissionais de saúde apresentaram sinais da Síndrome de Burnout no período da pandemia [5].

Outro estudo realizado pela International Stress Management Association (ISMA-BR) concluiu que o Brasil é o segundo país do mundo com o maior número de pessoas acometidas pela Síndrome de Burnout, em decorrência do alto nível de estresse [6].

No ano de 2020, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho registrou o maior número de pessoas que requisitaram auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez em razão de transtornos mentais [7].

Aliás, com a pandemia, o Brasil caiu 12 posições no ranking global da felicidade, ocupando a 41ª posição, conforme o relatório mundial da felicidade, produzido pela empresa de pesquisas Gallup em parceria com a ONU [8].

Além disso, as estatísticas demonstram que as mulheres têm sido mais afetadas pelo estresse e o esgotamento profissional em comparação aos homens [9].

De acordo com a análise feita pela consultoria McKinsey & Company e pela Organização LeanIN, ao entrevistarem mais de 65 mil pessoas de 423 empresas nos Estados Unidos e Canadá, conclui-se que 42% das mulheres sofrem com os sintomas da Síndrome de Burnout, enquanto entre os homens esta taxa foi de 35% [10].

Do ponto de vista normativo no Brasil, a Constituição Federal dispõe em seu artigo 196 que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Já sob a ótica internacional, a Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho [11] preceitua que “o termo ‘saúde’, com relação ao trabalho, abrange não só a ausência de afecções ou de doenças, mas também os elementos físicos e mentais que afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a higiene no trabalho”.

Entrementes, o Ministério Público do Estado do Piauí publicou um guia prático sobre a Síndrome de Burnout [12], indicando as causas mais comuns que originam o problema, quais sejam: (1) a quantidade de horas e o volume de trabalho; (2) insegurança no trabalho; (3) falta de apoio nas funções; (4) ser vítima de assédio; (5) falta de clareza de funções e de independência na gestão do trabalho.

Dito isso, apropriadas são as palavras de Luiz Manoel Andrade Meneses [13]:

“Seguindo a linha de estudos da OMS, conclui-se que não basta ser apto ao trabalho para se considerar o trabalhador com saúde. O ideal é que o trabalho jamais provoque qualquer dano à saúde do trabalhador. Se o trabalhador modificou o seu estado de saúde em decorrência do trabalho, está clara a ideia de que este dano enquadra-se no grupo de patologia cujo agente nocivo compreende a organização de trabalho, ou seja, o trabalho em turno extenuante, excessivo, repetitivo e que provoca uma atitude de quase autômato, por exemplo”.

Frise-se, por oportuno, que um estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde e pela Organização Internacional do Trabalho apontou que as longas jornadas de trabalho acarretaram o aumento de morte por doenças cardíacas e derrames, sendo que os homens estariam mais propensos a morrerem por excesso de trabalho [14].

Segundo tal investigação, as possibilidades de morte por problemas cardíacos aumentam em 42% para a pessoa que trabalha mais de 55 horas por semana, em um período de 16 anos. Já em relação ao risco de morte por derrame, este sobe para 19% [15].

No Japão, em outubro de 2020, o país teve mais mortes por suicídio do que por Covid-19, de modo que as longas jornadas de trabalho foram mencionadas como um dos fatores que contribuíram para o aumento deste número, dentre outras [16].

Noutro giro, outros fatores contribuem para o surgimento da Síndrome de Burnout no ambiente de trabalho, tais como: (1) cultura organizacional nociva da empresa; (2) falta de suporte dos gestores; (3) dificuldades de comunicação; e (4) desvalorização e cobranças excessivas.

Nesse desiderato, retorna à discussão os debates sobre a importância dos cuidados com a saúde mental dos trabalhadores, porquanto o ambiente saudável do trabalho é um direito de todos.

Portanto, as empresas terão pela frente novos desafios, sendo inevitável a mudança de hábitos tóxicos visando garantir a saúde de seus trabalhadores.

É imprescindível que ocorra o aperfeiçoamento da comunicação eficaz entre a empresa e o trabalhador, permitindo criar um ambiente de trabalho ainda mais saudável. Afinal, a pandemia trouxe algumas alterações que irão permanecer mesmo após este período, como, por exemplo, o trabalho remoto.

É cediço que as empresas deverão cuidar para que esta nova realidade não afete o ambiente de trabalho, incluindo os cuidados com as questões ergonômicas; devem ser evitadas longas jornadas de trabalho e metas abusivas; necessidade de se propiciar um ambiente harmonioso e, principalmente, possibilitar a desconexão com o trabalho, para que o trabalhador possa usufruir do seu direito ao lazer.

Em arremate, é forçoso que as empresas realizem uma conscientização de todos os trabalhadores a respeito da Síndrome de Burnout, oferecendo ajuda profissional para a solução do problema.

[1] Disponível em https://exame.com/carreira/burnout-vira-doenca-do-trabalho-em-2022-o-que-muda-agora/ . Acesso em 14.12.2021.

[2] Disponível em https://exame.com/carreira/oms-relaciona-a-sindrome-de-burnout-como-fenomeno-ligado-ao-trabalho/. Acesso em 14.12.2021

[3] Disponível em https://www.rededorsaoluiz.com.br/doencas/sindrome-de-burnout. Acesso em 14.12.2021.

[4] Disponível em https://pebmed.com.br/. Acesso em 14.12.2021.

[5] Disponível em https://portalhospitaisbrasil.com.br/sindrome-de-burnout-afeta-78-dos-profissionais-da-saude/. Acesso em 14.12.2021.

[6] Disponível em https://www.folhavitoria.com.br/saude/noticia/08/2020/brasil-e-o-2-pais-com-o-maior-numero-de-pessoas-com-sindrome-de-burnout. Acesso em 14.12.2021.

[7] Disponível em https://exame.com/bussola/empresas-tem-que-olhar-para-saude-mental-o-ano-todo-nao-so-em-setembro/. Acesso em 14.12.2021.

[8] Disponível em https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/03/19/com-pandemia-brasil-cai-9-posicoes-em-ranking-global-da-felicidade.ghtml. Acesso em 14.12.2021.

[9] Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/geral-58869558. Acesso em 14.12.2021

[10] Disponível em https://veja.abril.com.br/saude/sobrecarregadas-mulheres-sao-principais-vitimas-da-sindrome-de-burnout/. Acesso em 14.12.2021.

[11] Disponível em https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236163/lang–pt/index.htm. Acesso em 14.12.2021.

[12] Disponível em https://www.mppi.mp.br/internet/wp-content/uploads/2020/09/Ebook_Guia-pra%CC%81tico-sobre-a-Si%CC%81ndrome-de-Burnout-2.pdf. Acesso em 14.12.2021.

[13] A Dignidade do trabalhador e o equilíbrio no meio ambiente de trabalho. Revista do Departamento de Direito Social do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da USP, volume 7, número 1, julho de 2015 / junho de 2016. Luiz Manoel Andrade Meneses — juiz titular da 3ª Vara do Trabalho de Aracaju / SE.

[14] Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/business/longas-jornadas-de-trabalho-aumentam-mortes-por-doencas-cardiacas/. Acesso em 14.12.2021

[15] Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/saude/correspondente-medico-lapsos-de-memoria-e-irritabilidade-entenda-o-burnout/. Acesso em 14.12.2021.

[16] Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/japao-teve-mais-mortes-por-suicidio-em-outubro-do-que-por-covid-19-em-todo-o-ano/. Acesso em 14.12.2021.